Um pedreiro trabalhador, humilde, pai dedicado e marido amoroso, para acompanhar e apoiar suas duas filhas, autistas, decide fazer balé.
Isso mesmo. Joilson Santos, 54 anos, morador de Feira de Santana na Bahia, divide o seu tempo entre as obras e o estúdio de balé, no Centro Cultural Maestro Miro.
Ele, esposa e as filhas se deslocam do bairro de Viveiros em direção ao espaço cultural, no bairro de Muchila onde tem as aulas.
A região onde vive é a terceira mais pobre da cidade. O rendimento médio dos moradores é de R$ 754, menos da metade do resto do município, segundo o IBGE, Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística.
Joilson, a esposa Jaqueline e as duas filhas, Isabele e Iasmim fazem aulas com outras 8 crianças também diagnosticadas com autismo.
A dança faz parte de um método de tratamento, o Ballet Azul, cor utilizada para representar o autismo.
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Não tem sapatilha
Joilson é o único homem que faz as aulas junto com as filhas, calça uma meia preta para substituir a sapatilha.
“Onde que eu imaginava que ia fazer isso?”, brinca.
O pedreiro aprende os passos aos poucos. Quando a filha erra um movimento, o pai tenta corrigi-la, mostra como se faz. Os nomes franceses das posições também são um desafio.
“Quando que imaginei que meu marido, bruto desse jeito, ia dançar balé?“, brinca Jaqueline.
Os pais ainda estão em busca de uma escola na cidade que receba as meninas.
O Pai bailarino e pedreiro já participou de uma apresentação junto com as meninas e a plateia não tirava os olhos dele, já que era o único pai dançando.
“Ele é muito tranquilo. É o comportamento de quem sabe o que está fazendo, o que se deve fazer, sem nenhum afetamento, nenhuma exibição”, diz o diretor de atividades culturais, Luiz Augusto Oliveira.
A notícia da apresentação de Joilson ao lado das filhas logo se espalhou pela vizinhança do bairro.
PRECONCEITO
Na manhã do dia seguinte, a família ouviu do lado de fora da casa uma voz gritando para que “ele virasse homem”.
“Não gosto nem de falar sobre isso. Já falaram muita coisa feia para a gente”, lembra Jaqueline.
O irmão Juaci Salomé, de 50 anos, foi outro que provocou: “Tá fazendo balé agora, Joilson?”.
Até então, o mais velho dos sete filhos da família era um homem reservado, “rústico”, nas palavras do irmão. “Achei estranho, ele é o mais rústico da família.
Mas vi depois que ele tem sensibilidade a ponto de aprender até balé para ajudar as filhas”, disse Juaci.
No trabalho, os colegas também começaram a fazer chacota. “Quer dizer que você é bruto aqui, mas lá é mansinho”, repete, Joilson, em tom de brincadeira.
Mas hoje, ele não dá mais importância. “Aqui é discriminação de tudo”, resiste o pedreiro.
PROJETO GRATUITO
Esta é a primeira turma do Ballet Azul e é também a primeira vez que se tem registro de aulas de balé para pessoas autistas com acompanhamento dos pais, no Brasil.
“Percebi que os pais seriam grandes mentores. Comecei a pedir que eles repassassem tudo que era ensinado aqui. Vi que começaram a interagir bem mais”, explica o professor Adauto Silva.
As aulas gratuitas são do projeto Arte de Viver, mantido pela Prefeitura de Feira de Santana, e aberto a doações.
Com informações do Correio da Bahia